Kerouac encontra-se pouco esquecido no contexto de um movimento poético completamente revolucionário que surgiu nos Estados Unidos da América, no final da década de 50. – E é na sua geração beat que surge muitos dos grandes poetas americanos do século XX, com muitos dos seus porta-vozes como John Lennon, e mesmo Bob Dylan. Antes do movimento beat pairava sobre todos estes grandes autores o existencialismo em meados do século XIX e XX, tinha ele como objetivo influenciar as mentes preparatórias com o valor da existência humana e do seu pensamento com a crítica à autenticidade, natureza, sem sentido absurdo. Vejamos muitos escritores e filósofos que se manifestaram e o tornaram impulsionadores como Jean-Paul Sartre, Friedrich Nietzsche e mesmo Dostoievski, quiseram eles apresentar e publicar ideias com formas literárias necessárias, e não apenas tratados filosóficos, como Simone Beauvoir o fez, e tantos outros. Foi o existencialismo que impulsionou tantos estes escritores americanos, e não só surgidos em meados dos anos 50.
“On The Road” – Fez-me perceber o porque de tanta descrição sobre os loucos, que escrevia Jack, mas no seu livro são aqueles que dançam e se manobram sobre a euforia dos movimentos do corpo com batidas de blues e jazz que se ouvia bastante nas rádios americanas durante as suas viagens. – Talvez se eu ouvisse mais Charles Mingus, John Coltrane ou mesmo Chet Baker dançaria no meu quarto até às 4 da manhã, e depois voltaria a adormecer com o álcool no sangue, tal como Kerouac o faria. Mas para quê? E para quem? – Não era disso de que se tratava o movimento beat, até porque foi uma manifestação de um grande movimento vanguardista, anarquista, e até mesmo espiritual onde o budismo era uma arma de espírito e cultura para muitos.
Foi Jack Kerouac que introduziu o termo “Beat Generation” em 1948 quando visitou o movimento do jovens anticonformistas nova-iorquinos quando encontrou a verdadeira vanguarda, e o underground que se perpetuava no seu país, na cidade de Nova-Iorque, numa conversa com o escritor John Clellon Holmes.
“A poesia não nasceu para ser lúcida,
mas sim para mostrar os abismos do mundo,
e relevar o que é esquecido”
Foi importante arriscar, e é por aí que ele revelou o seu verdadeiro estado da sua enorme prosa poética, com vozes de manifestação e libertação total da sua mente contra um sistema, ou mundo em guerras.
Os livros que escreveu como “Os Vagabundos do Dharma”, “Big Sur”, “Viajante solitário” – É uma escrita completamente fora do vulgar e revolucionária, bastante respeitada nos dias de hoje, como uma vida num a correr atrás de um carro para chegar a outro estado, ou mesmo o seu humor negro de um jeito bastante interessante, foi escrito, e é introduzido nas suas grandes viagens dentro das pequenas, e das grandes cidades americanas com os valores do velho mundo, ou seja ainda bastante conservadoras. Ele decifrou tudo isso e transformou em magia com um lado libertino, e ao mesmo tempo de visualização total sobre a miséria vivida em cada estado americano, ou mesmo no que experienciava.
A Geração beat foi uma das gerações mais iluminadas de enormes escritores, pintores, poetas, ensaístas e romancistas americanos com a vontade de extorquir a realidade vivida nessa época. – É impossível enumerar todos os nomes da beatífica geração, mas é concreto que nasceu muita criatividade que ainda hoje é possível ler.
O autor expressou-se numa linguagem espontânea, e em descontentamento com a sua geração, apesar de ele não se considerar pretensioso, ao ponto de dizer que era uma Voz. As suas caraterísticas mais marcantes são o seu romantismo, ou mesmo a exaltação sobre os problemas ambientais, e claro o uso de drogas para a celebração da sua não lucidez. Foi por aí onde se perderam grandes autores, como Jack, ou mesmo Allen Ginsberg (escritor, poeta e filósofo), William Burroughs (crítico, escritor e pintor), e tantos outros que se revelaram numa geração conturbada com a guerra do Vietname durante o movimento hippie em meados dos anos 60 quando o BUM da literatura estaria a surgir como uma enorme manifestação das palavras.
Talvez Jack não se revia numa escrita conotada como compulsiva, ou mesmo num pensamento desordenado, e por vezes caótico entre a poesia e o estado social, mas a sua prosa vinha da dopamina consumida no seu dia a dia, como a sua crítica para muitos era importante para a revelação do novo anarquismo literário. A poesia não nasceu para ser lúcida, mas sim para mostrar os abismos do mundo, e relevar o que é esquecido.
Era também na linguagem informal que ele se revia, como a leitura da poesia em caves ou espaços noturnos em Nova Iorque, a escrita ordinária e erótica também se desenvolveu bastante nesta época, mas Jack elevou-se bastante, ganhando um enorme respeito, com a sua bibliografia magistral. Conduzindo-a ao estilo-avalanche sem preocupação com a pontuação ou os parágrafos. Ele mesmo disse que existiu o uso de benzidina, uma anfetamina para a criação de alguns livros, como o “On The Road”, o autor escreveu-o durante sete anos andando numa encruzilhada pelos Estados Unidos da América, pedido boleia e escrevendo num bloco de notas.
Pode-se revelar que Jack era um heterónimo e o seu verdadeiro nome era Jean-Louis Lebris Kerouac, escritor, romancista, poeta e pintor americano. Faleceu aos 42 anos tendo uma vida atroz, maravilhosa e agitada durante a sua vivência, foi e será um dos escritores mais importantes da sua década.
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Miguel Leonardo, é escritor, poeta, ensaísta, músico, ator, guionista e realizador. Aos 16 anos começa o seu primeiro movimento poético com Luís Oliveira e Nuno F. Silva, o movimento Ultra Abjecionista. Entre 2020 e 2021, foi personagem principal nas curtas-metragens «Contra Tempo», «Subsolo» e «1 de Janeiro». Aos 25 anos, lançou a sua primeira curta-metragem, «O Rapaz Que Pensava Demais», nomeada em alguns festivais de cinema em Portugal e no estrangeiro. No mundo da literatura escreveu «A Voz de Lisboa com Paris» (Gato Bravo, 2023, janeiro) e «Pena Humana» (Poética Grupo Editorial, 2023, dezembro), com ilustrações de Luís Silveirinha.