3 poemas de Mustafa Seyfi
elegia do proletariado
sou um trabalhador,
a única árvore esquecida em uma floresta em chamas
item mais barato de registros contábeis
o santo que está trancado pelas portas
no tempo em que entra e sai com senhas
deus não sabe nada sobre esses dias
sou um trabalhador,
não posso começar minha vida com a pergunta que eu escolho
obrigaram-me a arrancar grandes rosas em botão para fazer sabonetes,
cortar os sicômoros para bancadas sem sombra,
secar as chuvas para uma estepe,
arrancar minha alma para me tornar uma peça sobressalente
sou um trabalhador,
que só ressuscita nos finais de semana
e morre toda segunda-feira novamente
centavo perdido em registros contábeis
deus não sabe que todo dia é segunda-feira
*
temer
eu durmo,
as estrelas de um conto caem em minhas pálpebras,
uma criança brinca com sua sombra
em um jardim sem árvores,
crescem as palavras fragmentadas,
relâmpagos piscam negramente – na rachadura em sua testa
arames farpados nas paredes,
um pedaço do meu sonho está preso
e rasgado.
o silêncio é o grito mais alto
uma tonalidade de betume é acesa
um tenebrado acorrentado, mancha o sol
um homem, vinte e três em sua identidade
trinta e cinco no espelho, pesa seu cadáver.
tudo dele é
um registro de nome de sete letras em listas telefônicas,
o mundo é mais visto através de zíperes.
a escuridão às vezes é uma parte integrante da luz
a escravidão bate na cabeça a liberdade
com marretas.
rei frio da ordem pega a estrada.
cale-se,
silêncio,
hocus pocus
poemas tocam o vazio
silêncio é ouvido.
um pedaço de nuvem, dois fragmento de chuva
o nome do poeta é escrito em letras minúsculas.
a solidão é a maior multidão
*
manifesto de pipa azul escuro
o céu é azul, eu mesmo suponho
como um marinheiro vagabundo neste momento.
o céu é azul,
uma pipa, azul escuro; no meio do azul.
um garoto de cabelos castanhos na ponta da pipa
com olhos saturados, rosto enevoado, sorriso corajoso.
seu cérebro esperançoso e limpo
talvez não consiga resolver muitas matemáticas do mundo,
talvez não seja suficiente para química, alquimia,
alguma intriga do mundo…
mas agora ele tem as mãos limpas
e uma pipa azul escura,
deu um chute no peito do
caos chamado vida.
e não há mais talvez,
mesmo que ele esteja com frio em seus próprios sonhos cor de gelo,
ele não se curvará às suas fontes falsas,
não vai beijar suas mãos sujas
jurando lealdade à sua tirania.
não talvez, é certamente…
uma pipa azul escura no meio do céu,
um menino de cabelos castanhos na ponta de uma pipa
que ainda não foi derrotado pela vida,
tem uma libélula em seu coração.
o céu é azul, eu mesmo suponho
como uma espécie de marinheiro
*
Tradução do turco para português por Carolina Aureliano Seyfi.
♦
Mustafa Seyfi, nasceu na cidade de Izmir, Turquia, em 1991. É membro de uma família curda de origem operária e camponesa. Jogou basquete como atleta licenciado. Atualmente trabalha como especialista em serviços financeiros em uma universidade estadual, na cidade de Manisa, Turquia. Porém já exerceu diversos trabalhos: como garçom; trabalho em construção; tradutor, editor e redator; contabilidade e comércio exterior. Embora tenha feito uma pausa nas atividades de escrita, que iniciou no ensino médio, Mustafa colocou novamente a literatura no centro de sua vida, depois de ter sobrevivido a dois cânceres, em 2019 e 2021. Após o período pandêmico que abalou todo o mundo, o autor apareceu nas revistas mais importantes de seu país e começou a se destacar na literatura turca. Nesse período, publicou 3 livros de poesia, foi incluído no livro de seleção de contos e ganhou 3 prêmios de poesia e 1 prêmio de conto. Foi galardoado com o Prêmio Enver Gökçe de Poesia Socialista, Prêmio de Poesia Kaygusuz Abdal, Seleção do Prêmio Çukurova de Conto (Çukurova da Migração), Prêmio Muammer Hacıoğlu de Poesia e o Prêmio de contos da Academia de Redação de Istambul.