Fora da Ordem I Conto de Adriano Espíndola Santos

Tenho que me livrar disso. Paulo é casado. Ainda não sei por que me meti nessa confusão. Sim, sei, foi Paulo malandro que me seduziu. Ele não é um homem qualquer, é muito hábil, isso eu tenho de dizer, sabe tratar uma mulher como ninguém, é engraçado e de bem com a vida. É malandro, mas é honesto, nunca me enganou nem me prometeu nada. Fiz o que fiz porque quis. Quando me levou a Paris, numa viagem de primeira classe, me falou de sua paixão por mim, que não queria me perder, mas que não estava disposto a acabar com o casamento, porque Carla precisava dele. Bem, ele queria formar um trisal, isso ele não me falou, deixou a sugestão no ar. Fiquei encantada por Paris, não conhecia, e estar com ele foi a cereja do bolo. Foi uma viagem de cinco dias, maravilhosa, em que ele deu a desculpa à Carla de que teria de visitar uma feira de negócios, que era jogo rápido, como de fato foi. Passear de mãos dadas com ele, sem síndrome de culpa nenhuma, foi o melhor de tudo. Podíamos fazer sexo três vezes ao dia, e eu não acreditava que tinha um homem tão potente ao meu lado, porque o Rogério, meu antigo namorado, queria transar uma vez por semana, e olhe lá, e isso para mim era inadmissível, para uma pessoa saudável. Ele depois me revelou que era depressivo, o caralho. Mas disso não quero nem lembrar. O que me interessava, até pouco tempo, era Paulo – e a verdade é que ainda não consegui esquecer aquele homem com “h”, garanhão, dono de duas mulheres. Agora a sua mulher espera o segundo filho, soube há duas semanas, depois que fizemos sexo. Dei um esporro nele. O momento era absolutamente inoportuno. Coloquei-o para fora de casa com um pé na bunda. Disse que ele não queria nada comigo, só me usar para as suas aventuras fetichistas. Dei um basta! Mas não sem me sentir um traste, uma vagabunda… Com esse segundo filho, a nossa distância aumentava, ele teria de dar atenção à Carla, grávida, e ao Mauricinho, o seu filhinho de quatro anos. Eu devia ligar para a tal da Carla e dizer que estou, também, esperando um filho dele, nem que depois dissesse que teria perdido. Mas o divórcio é improvável. Nada vai acontecer. Ele já vai pro segundo filho com a Carla, e só falava dela, do Mauricinho e do Luan, que vai nascer. Sou bem-sucedida, não preciso dessa encrenca toda. E o pior é que o cara é mala, me seduziu de um jeito incomum. Ele marcou uma sessão de terapia, sem se identificar, e, quando vi, já estava atendendo ao meu amante. Aconteceu de ele me levar ao chão e me penetrar, do jeitinho que eu gosto. Safado. Vai se ferrar agora. Estou saindo com o Messias, o cara que conheci no aplicativo. Parece gente boa. Até agora não transamos. Preciso saber se ele é bom mesmo de cama. Hoje teremos um encontro. De hoje não passa.
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Adriano Espíndola Santos é autor de “O sussurro cálido da negação”, “Flor no caos”, “Contículos de dores refratárias”, “o ano em que tudo começou”, “Em mim, a clausura e o motim”, “Não há de quê”, “Amparo secreto” e “Viver morrendo”. Advogado. Mestre em Direito. Licenciado em Letras-Português. Especialista em Escrita Literária e em Revisão de Textos. Membro do Coletivo Delirantes. É dor e amor; e o que puder ser para se sentir vivo: o coração inquieto. instagram.com/adrianobespindolasantos/