“O trovão vigoroso quebra-nos os ossos” I Poesia de Natasha Sardzoska
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PELE
Folhas amarelas na sua pele
poros rasgados de calor incompreensível
lábios gretados e um vale inchado
de pensamentos e mamilos.
Pele
eu digo
estás sozinha
ou a hora está a afastar-se do relógio aceitável
e ouço como deslizam sobre as camadas pálidas
gotas lágrimas secreção vinho
mas não é a primeira vez
é um retorno constante
e confusão antes das eleições que não queres aceitar
quando chegar este outono
na sua pele
numa inundação de espaços
inadequados
indecentes
indignos
*
FRATURA
se não vier nessa altura
se não se deixar livre durante uma hora
vou transformar-me em chuva
vou inundar a sua casa
vou transformar-me em fogo líquido
vou queimar todo o seu trigo
vou dissolver o meu coração em lágrimas
e nisso vou-te afogar
*
FOGO LÍQUIDO
encontramo-nos olhos nos olhos
o trovão vigoroso quebra-nos os ossos:
é amor
mesmo que não tenha um amanhã
nem tem hora
mas é apenas circular
de cabeça para baixo destrói-nos
mesmo se flutuarmos
no ar da nossa festa
tambores batem nos nossos peitos
dissolver o nosso fardo
espalham-se
entre os espaços da madrugada
eu derreto em ti
afluente com olhos de menina
irrevogável e irreversível
fugitiva do alfabeto
fugitiva da matemática
não espacial nem temporal
tu e eu
duas estranhas sinfonias
duma tumultuosa mudez
*
CORPO CONFINADO
Este corpo não é o meu corpo
outros corpos vivem em mim:
corpos que eu chamo os meus
porque me pertencem.
Eu tenho um pacto
com todos os microrganismos
que vivem em mim
e que procuram-me
que gritam por dentro
e queimam-me
e querem sair de mim:
mas eu nunca lhes vou dar
trégua.
Tradução dos poemas para o português realizada pela própria autora.
♦
Natasha Sardzoska, poeta, ensaísta, escritora, tradutora literária e intérprete poliglota macedónia, é doutorada em antropologia pela Universidade Eberhard Karls de Tübingen, Sorbonne Nouvelle em Paris e Universidade de Bérgamo. Leciona na Universidade Internacional Schiller em Heidelberg na Alemania. É editora de poesia na Borders in Globalization Review da Universidade de Victoria. Publicou os livros de poesia Quarto Azul, Pele, Ele puxou-me com cordel invisível, Água Viva, Cóccix e Lições de Falácia e os romances Tramontana e Vida sem Testemunhas, livros de poesia nos EUA, no México, em Itália, em Croacia e no Kosovo; a sua poesia foi traduzida em 20 línguas e publicada em revistas literárias internacionais. Em 2024 teve uma apresentação literária no Instituto Cultural Italiano em Estugarda e várias leituras de poesia em Nápoles, nomeadamente no espaço literário e musical Perditempo. Em 2021, recebeu o prémio Poesia a Napoli por poema escrito em língua italiana pela Guida Editore e o prémio Don Luigi de Liegro por poesia escrita em língua italiana como poeta não-nativa em Roma e pela Associação de Escritores Croatas Prémio para livro publicado fora da Croácia em Rijeka em 2023. Participou em vários festivais literários entre os quais: Festival Ars Poetica na Galeria Nacional de Bratislava, o Festival Internacional de Poesia de Génova no Palazzo Ducale, o Festival Literário Grito em Rijeka, o Festival Internacional de Poesia festival em Medellín, o Festival de poesia Ritratti di poesia em Roma, o Poesiefestival na Academia de Artes de Berlim, o Festival de Poesia Sha’ar em Tel Aviv no Teatro Árabe-Hebraico e festivais literários em Budva, Sofia, Zagreb, Belgrado, Tirana. É a primeira e única tradutora de Pier Paolo Pasolini, Pedro Salinas, José Saramago e Joan Margarit em língua macedónia.
Créditos da fotografia de Natasha Sardzoska: Dirk Skiba