“Enquanto a narrativa proporciona raízes para a compreensão do mundo, a informação atual fragmenta e dispersa, dificultando a criação de um sentido partilhado.”
Walter Benjamin
A essência de contar reside no seu poder para criar laços, estabelecer conexões e tecer um tecido comum que une as pessoas. São nas histórias, no acto de contar e compartilhar experiências por meio da linguagem escrita ou oral, que nascem os laços que nos conectam e identificam-nos como comunidade. No entanto, nos dias de hoje, esta arte de contar histórias enfrenta uma mudança fundamental que traz consigo uma crise profunda: o storytelling tornou-se um instrumento do capitalismo contemporâneo, perdendo o seu espírito original no turbilhão da sociedade da informação.
Byung-Chul Han, filósofo de origem sul-coreana, na sua investigação sobre esta crise narrativa, “La crisis de la narración” (Herder Editorial, 2023) apresenta uma ideia-chave: a narrativa e a informação são forças opostas. Inspirando-se no pensamento de Hegel, Walter Benjamin ou Proust, Han argumenta que enquanto a narrativa procura transmitir experiências, conectar as pessoas e dar significado ao tempo, a informação na era actual tende a transformar os indivíduos em consumidores solitários, isolados num mar de dados e rapidez. Esta mudança em direção à individualidade e à obsessão pela produtividade levou a que o acto de contar se dilua num oceano de mensagens, perdendo a sua capacidade de criar um sentido partilhado e colectivo.
A sociedade contemporânea, envolta na voragem da informação incessante, tem desvanecido o poder transformador das histórias.
Nesse sentido, o filósofo autor da “Sociedade do Cansaço” destaca a necessidade urgente de resgatar o espírito genuíno da narrativa, do acto de contar histórias e da importância da linguagem escrita e oral. É crucial reconhecer o seu potencial transformador e a sua capacidade para unir as pessoas numa história comum. Recuperar este poder essencial das histórias para transcender a mera acumulação de dados e voltar a conectar-nos como seres humanos é um desafio imperativo na era contemporânea.
A crise na narrativa segundo Byung-Chul Han é um apelo para resgatar o valor perdido das histórias, recuperando a sua capacidade para unir, dar significado e criar comunidades num mundo saturado de informação fragmentada e descontextualizada. Assim, o convite de Byung-Chul Han transcende a mera identificação de um problema: é um chamamento para uma transformação profunda. É um convocar para reafirmar o papel fundamental das histórias como pilares culturais, capazes de fomentar uma coesão significativa e, por conseguinte, restaurar o tecido social que se desgasta no turbilhão da era da informação. Ao abraçarmos esta busca pelo resgate da narrativa, abrimos portas para um reencontro com a essência humana, capacitando-nos a forjar um sentido colectivo no caos informativo que nos rodeia.